Pai
ajuda filho com paralisia cerebral a se formar jornalista
Pai
foi ovacionado pelos formandos e recebeu da faculdade uma placa de honra ao
mérito; rapaz agora procura emprego. Todos os dias, durante os últimos quatro
anos, o ex-bancário Manuel Condez, 60, dedicou a mesma rotina ao filho Marco
Aurélio, 26, que convive com sequelas severas de paralisia cerebral: deu banho,
penteou os cabelos, carregou-o no colo até o carro e o levou para a faculdade
de jornalismo a 17 km de casa.
O pai assistiu a todas as aulas, anotou as
lições dadas pelos professores, auxiliou o filho na feitura das provas
escrevendo no papel aquilo que ele lhe soprava, ajudou intermediando
pensamentos, foi o motorista do grupo de trabalho e o assessorou em entrevistas
e em reportagens. Na semana passada, Marco recebeu o diploma da Universidade
São Judas, em São Paulo, e Manuel viveu uma das noites mais emocionantes de sua
vida, sendo o grande homenageado. Foi ovacionado pelos formandos e recebeu da
direção da faculdade uma placa de honra ao mérito.
"Não
fiz nada demais. Qualquer pai que tem amor ao filho também se dedicaria. Era um
desejo dele fazer faculdade, e eu só ajudei a realizar", diz Manuel,
com os olhos marejados. Marco tem braços, mãos e pernas atrofiados, fala com
dificuldade, já foi submetido a 11 cirurgias reparadoras, usa cadeira de rodas
e programa especial de computador para ter mais autonomia. Precisa de cuidados
específicos para tocar o dia a dia. "O
único ponto meu que ainda não foi operado é o cérebro", brinca o
jovem, que lida com naturalidade com o estereotipo de que paralisados
cerebrais, necessariamente, têm comprometimentos intelectuais.
DESTAQUE DA TURMA
O rapaz não só tem pleno domínio do intelecto
como, na avaliação de colegas de turma e de professores, foi um dos melhores
alunos. "Com o apoio do seu Manuel,
o Marcão fez tudo: vídeo para TV, programa de rádio, debate. Ele se destacou
muito. Tinha ideias contundentes e sempre se saia bem nas provas",
conta Raquel Brandão Inácio, amiga do jovem e parte de seu grupo de trabalho de
conclusão de curso, sobre novas famílias.
Professor e agora colega de profissão do
rapaz, Celso de Freitas diz que pai e filho "quebram um cenário comum de pessoas com deficiência, que é ficar dentro
de casa e não enfrentar a vida." Para o mestre, "Marco tem
inteligência acima da média, e Manuel foi tratado como um aluno, não como um
acompanhante. Nas aulas de rádio, propus a eles fazerem apenas trabalhos
escritos, mas, a sua maneira, entregavam gravações de áudio."
EXTENSÃO DO CORPO
O protagonismo que o pai teve e tem em sua vida
é claro para o jornalista. "Ele é
uma extensão do meu corpo. Quando não posso fazer algo, ele está sempre ali
para me ajudar, nunca para me atrapalhar", afirma Marcos. Agora, o
jovem, que gosta de rádio e de esportes, está atrás de uma vaga no mercado de
trabalho. "Quero usar o conhecimento
que adquiri, quero ajudar os outros com meu trabalho. Não fiz faculdade para
ficar no Facebook."
Pai e filho já começaram uma nova empreitada:
estão fazendo aulas de inglês. Juntos, evidentemente. "Nossa família está unida para tentar ajudar
o Marcos a quebrar outras barreiras", declara Manuel.
Fonte: Jornal
Folha de São Paulo, Carderno Cotidiano, 07/04/2013
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